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ENSAIO SOBRE O CONCEITO DE CONSCIÊNCIA EM HUSSERL
ENSAIO SOBRE O CONCEITO DE CONSCIÊNCIA EM HUSSERL

 

O CONCEITO DE CONSCIÊNCIA EM “IDEIAS PARA UMA FENOMENOLOGIA PURA E PARA UMA FILOSOFIA FENOMENOLÓGICA”. Prof. Venâncio

 

HUSSERL, Edmund. Ideias para uma Fenomenologia Pura e para uma Filosofia Fenomenológica. Aparecida, SP: Ideias e Letras, 2006.

 

 De forma direta já poderíamos dizer que a consciência, para Husserl, aprazado pela intencionalidade, sucede-se na relação dual sujeito/objeto. Os fenômenos apresentam-se na consciência e, esta, lhe dá sentido. Dificilmente encontraríamos um conceito bastante literal para uma definição de consciência no pensamento do filósofo Edmund Husserl: o que ele elenca em sua compreensão de consciência é o método fenomenológico de investigação das coisas à consciência.  Ou seja, quais as verdades que aparecem para consciência? São as coisas mesmas?

Uma das propostas promovidas por Edmund Husserl em sua fenomenologia encontra-se na critica a atitude natural do homem. Este, implexo numa sociedade norteia-se na convicção fundamental de mundo.[1] Tendo em vista essa persuasão baseado numa espécie de “tese geral”, assegurando-se desse conhecimento como se isto elevasse seu grau de compreensão de mundo. Husserl então busca retirar essa atenção natural[2] do homem em relação ao mundo pela redução transcendental, isto através da cisão da atitude natural com esse mundo “apodítico”. Essa atitude de Husserl encontra-se nas primeiras linhas introdutória do livro (2006, P. 27):

 

A fenomenologia pura, cujo caminho aqui queremos encontrar, cuja posição única em relação a todas as demais ciências queremos caracterizar e cuja condição de ciência fundamental da filosofia queremos comprovar, é uma ciência essencialmente nova, distante do pensar natural em virtude de sua peculiaridade de principio e que, por isso, só em nossos dias passou a exigir desenvolvimento.

 

Edmund Husserl, em sua fenomenologia, busca aventar um novo método de ver o mundo tal como ele nos aparece, ou até mesmo, como ele é em essência.[3] Edificando em suas instâncias a atitude fenomenológica, não abandonando os meios dos quais a ciência encontrou para explicar esses “fenômenos”, mas redescobrindo ou reaprendendo tudo sem as conclusões teórico-científicas.

Para Husserl, o que estabelece a ideia de uma fenomenologia pura é a relação existente entre essência e sua ciência em contraposição a fato e ciência de fato. Os princípios determinantes de todas essas ações devem ser compreendidos em sentido correto, como afirma o próprio Husserl (2006, p.59):

 

O que ali fizemos, que isso fique bem sublinhado, não foi ministrar ensinamentos a partir de um ponto de vista filosófico previamente dado, não lançamos mãos de doutrinas filosóficas recebidas e mesmo universalmente reconhecidas, mas efetuamos, no sentido rigoroso, algumas amostragens de princípio, ou seja, apenas exprimimos fielmente diferenças que nos são diretamente dadas na intuição.    

 

 

 

Neste caso os princípios tornam “puros”, sem nenhuma ideia especulativa do que “isso” poderá vir a ser. Contrárias às teorias já pré-estabelecidas tradicionalmente que são asseguradas apenas não no que é, mas naquilo como aparece para o homem.

Para o empirista a razão autônoma corresponde a única “autoridade em questões de verdade”, segundo a interpretação husserliana sobre as razões empíricas, orientar-se cientificamente, a juizados sobre as coisas mesmas, significaria voltar ao próprio “objeto”, dado ou fato, desligando-se arbitrariamente de todos os tipos de informações (pré-formadas) sobre o mesmo. Necessário apenas colocar de lado os preconceitos e, através do que está sendo oferecido, buscar o que é verdadeiro (essência).

Isso a que chamamos verdadeiro ou essência é o que se torna passível de experimentação, ou seja, o que é real, as relações proporcionais a esse real, como meio de possibilidade são apenas imaginações fixas no conteúdo psicológico do homem.

Como ideias anteriormente estabelecidas por círculos viciosos, ou porque não costumeiros, daqueles hábitos que são capazes de levarem o homem a crer que ele conhece a verdade de todas as coisas. Antes mesmo de ele saber que o que é conhecido não é o que “é-mesmo”, ou melhor, não é a coisa em si, mas, sim, aquilo que “parece ser” a coisa em si mesma.

Os empiristas naturalistas buscam na sua fundamentação algo bastante precioso em caráter de defesa de suas organizações, descartando todo tipo de pré-juizo articulado a um dado objeto que junto a eles aparecem caracterizado com todas ou algumas informações dos quais esses empiristas não haviam experimentados.

O que Husserl acredita ser o erro de princípio da argumentação empirista é que o conhecimento para eles é dado apenas pela experiência (HUSSERL, 2006, P. 61).

 A última fonte legítima de afirmações racionais é o “ver”, a explicar: aquilo que foi realizado imediatamente a qualquer dado apresentado. Mas a sua legitimidade funciona apenas enquanto doadora originária.

Qualquer que seja outra fonte de informação sobre o que está sendo visto, uma outra maneira de ver surge imediatamente. Com isso vem também outra maneira de legitimidade sobre o dado ou fonte que foi visto imediatamente, criando formas, cores ou cheiro sobre o mesmo. É o que Husserl diz sobre a possibilidade dos quais os empiristas acreditam conhecer as coisas: através do contato com elas mesmas.

A intuição parte no ciclo de identificação em ciência geral, porém, essa identificação não participa mais do contexto de uma ciência empírica. Assim sendo, o pensar eidético puro leva a um ceticismo (Husserl, 2006, p. 63).

Entretanto, o filósofo Husserl chega a conclusão que toda experiência direta passa apenas em sua etapa doadora de singularidades e não de generalidades (Husserl, 2006, p. 63). Tornando-se impossível conhecer o todo. Por isso então não pode haver uma definição correta e afirmativa de algo.

A construção do debate posto por Husserl entre a experiência e a intuição nos fornece uma problemática que acaba pondo em questão a veracidade indutiva: por um lado, os empiristas que se agarram apenas na experiência direta, e, por outro lado, os céticos que, embora neguem a evidência eidética das “coisas” em geral, eles recorrem à indução e aos modos imediatos de inferência, as mesmas os quais a ciência empírica obtém suas proposições gerais (Husserl, 2006, p. 63).

Necessariamente os empiristas deveriam ter clareza nas suas definições, justificando o não contrassenso em suas discussões, o que se torna tarefa difícil por causa do caminho que eles percorrem, caracterizado por suas razões, os empiristas precisariam em sua fundamentação entrar em total acordo com significações elaboradas diante das apresentações expostas para as afirmações de suas certezas.

Eles (os empirista) partem de opiniões pré-formadas criando para si uma posição afirmativa, negando toda possibilidade de especulação. Mas como chegar a uma opinião “experimentada” no exato momento de contato com o dado apresentado e, dessa experimentação deduzir algo sobre o mesmo? Seria essa a problemática que Husserl encontraria nesses mal entendidos naturalistas empíricos.

Talvez assim pudéssemos encontrar as respostas nas relações paralelas que também já outrora foram ocupadas (em termo de experimentação) por esses empiristas que dizem acreditar conhecer através de seu contato com o dado-objeto.

Husserl (2006, p.64) se defende dizendo que:

 

(...) nós outros temos nosso ponto de partida naquilo que se encontra antes de todo ponto de vista: na esfera completa do que é dado intuitivamente e antes de todo pensar teorizante, em tudo aquilo que pode ser visto e apreendido imediatamente – não nos deixando ofuscar por preconceitos e ficar impedidos de prestar atenção a classes inteiras de dados autênticos.

 

 O objeto é definido como conceito de um determinado momento de atribuição a algo que acontece ou aparece e não sendo jamais pensado dentro da filosofia husserliano como uma realidade, porém como uma “manifestação” fenomênica atribuída pela análise psíquica do homem, ou como elucidou o próprio Husserl: que o objeto é definido como sujeito de um enunciado (categórico, afirmativo) verdadeiro (HUSSERL, 2006, P.66).  

   No seu método “radical”, Husserl na analise de consciência propõe a epoché[4], deixando provisoriamente de lado todo tipo de conhecimento já antes pré-estabelecido sobre algo. Dito de outra maneira, Husserl ao realizar a epoché põe em “entre parênteses” as teorias, as formas, definições para que a consciência possa agir naturalmente diante do mundo.

Esse será o esforço que o homem dá para captar as coisas em si mesmas, porém isso não quer dizer que o objetivo desse filósofo ou do homem da ação seja dizer o que as coisas são em sua definição como algo, falando delas, formando outros conceitos sobre a mesma. A verdade da consciência das coisas mesmas para Edmund Husserl correlaciona-se a sua critica ao conhecimento cientifico, tendo em vista o erro interpretativo dessa ciência ao mundo, ele acredita não haver verdade (apodítica) nas coisas que aparece externamente. A verdade ou essência não pode ser falada/dita como algo: o pensamento pode ser expresso por palavras, mas isso não significaria que o que eu penso e declaro a todos seja a coisa mesma. Ela pode ser (e deve ser) a projeção do meu pensar transcendental, mas não a coisa em si, ou até mesmo em sua pureza ou originalidade.

Para o processo de método fenomenológico de Husserl designa-se a acuidade da epoché que não estabelece a dúvida da existência do objeto/dado/apresentado, simplesmente Husserl pretende encontra a verdade das coisas reduzindo-a à consciência. É inegável a influência sofrida por esse filósofo do pensamento cartesiano. Claro que o que se encontra são apenas apontamentos dos quais Husserl acredita ter faltado na filosofia de Descartes: isso promove a Husserl uma reformulação da filosofia cartesiano.

            Tanto para Edmund Husserl como para René Descartes o eu será aquilo que temos como certeza das outras confirmações obtidas das outras certezas. Porém o que Husserl definiu como o erro cartesiano é a independência que Descartes dará ao cogito: penso logo existo. Husserl então diz: todo aquele que pensa... pensa algo. Por tanto não se pode separa o que pensa (cogito) do pensamento (cogitatum). Não podemos separar o mundo da consciência, como também a consciência do mundo. Ambos têm suas relações dependentes um do outro. Como diz a celebre frase de Husserl:  a consciência é sempre consciência de algo.

            Podemos concluir dizendo que para Husserl a consciência é aquilo que existe mais interno no homem, que então este busca em sua relação com o mundo as percepções viventes e presentes na atualidade do ser. Porém, se faz necessário compreender que o que chamamos de interno não poderá jamais ser entendido em contraposição de externo. O que dizemos então é que esse imo corresponde à qualidade perceptiva das coisas no mundo. A ipseidade correspondente a essa qualidade apontada acima é a capacidade que temos de aproxima-se da coisa mesma em si.



[1] Como foi bastante discutido em sala: mundo no sentido de totalidade, ou seja, como conceito metafisico.

[2] Natural aqui se resume a aquilo que é habitual ao homem, neste caso o mesmo, intrínseco a uma sociedade.

[3] Essência apresenta-se aqui em seu sentido de ipseidade. 

[4] Termo de cunho filosófico-grego do qual os antigos traduziam por “suspensão” do juízo a respeito das coisas.